Na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line, ela analisa as estruturas da base do Movimento dos Trabalhadores Desempregados (MTD) e compreende o movimento como “uma ferramenta de transformação da realidade em que se encontram estes desempregados históricos.
IHU On-Line – Quais as principais demandas e desafios hoje do Movimento dos Trabalhadores Desempregados do Rio Grande do Sul?
Rita de Cássia Machado – Gostaria de iniciar esta conversa falando sobre a importância do Movimento dos Trabalhadores Desempregados (MTD) para a luta atual da classe trabalhadora, que clama por melhores condições de vida e trabalho. Trabalho, esta é a principal demanda. O Movimento entende que é pelo trabalho que se gera renda, e que é pela renda que se acessam as formas de sobreviver. A Organização tem como bandeira de luta o trabalho emancipador, constituidor da vida humana, da humanização. As experiências do Movimento e a proposta do trabalho ultrapassam a relação da produção, ligam-se com o modelo de sociedade que se busca construir conjuntamente. O trabalho, neste sentido, caracteriza-se como a matriz da formação do ser humano em sua dimensão integral. O trabalho organizado de forma coletiva e cooperada é, para o Movimento, gerador de novos valores, cultura, consciência e relações sociais, além de possibilitar a elevação da qualidade de reprodução material da vida. O trabalho funda a vida humana, assim é ponto de partida do processo de humanização e é princípio educativo.
IHU On-Line – Você pode caracterizar quem são os sujeitos da base do MTD?
Rita de Cássia Machado – É uma realidade brutal. Eu diria que existe no Movimento “uma brutalidade da vida”, mas há também “a resistência dos de baixo”. A realidade é muito dura, é de baixa qualificação profissional; baixa escolaridade ; precariedade no acesso a informações e a políticas públicas; ausência de condições estruturais para gestar e consolidar alternativas de trabalho. Vivem o drama da violência urbana, da falta de infraestrutura básica, como creches públicas para atendimento das crianças de 0 a 6 anos, de escolaridade para os maiores – EJA, da falta de escola pública, de saúde, de saneamento, de casa popular. Os problemas apresentados e trazidos de forma sistematizada pela pesquisa que realizo tratam da própria miséria e da precariedade em que vivem estas pessoas.
Qual é a visão que os membros do Movimento dos Trabalhadores Desempregados têm de mundo do trabalho hoje?
Rita de Cássia Machado – A de que o trabalho é central em suas vidas. Pois estar sem trabalho significa estar demitido de suas próprias vidas. Neste sentido, as experiências de trabalho desenvolvidas pelo MTD são sempre com o foco na geração de trabalho e renda, ou seja, no trabalho como proposta de superação do desemprego histórico, para que as mudanças necessárias sejam estruturais e não apenas soluções imediatistas ou paliativas, como é o caso de bolsas e programas assistenciais, que não vêm acompanhados de propostas estruturais da realidade das pessoas. Porque se entende no Movimento que, mesmo que todas as pessoas se qualifiquem, não haveria lugar para todos no mundo do trabalho hoje constituído.
Na complexidade e dinamicidade que envolve a produção hoje, onde o capital se reproduz sem necessitar das pessoas, eles continuariam de fora. Portanto, entende-se que a mudança deve se dar no mundo do trabalho, na forma que se produz, no jeito que se organiza o trabalho, e não somente nos que dele foram expulsos. Portanto a qualificação profissional como proposta de qualificar para o mercado, nesta realidade de desempregados, é discurso sem sentido.
Em que sentido o desemprego pode ser apontado como uma construção social?
Rita de Cássia Machado – No caso do desemprego dos trabalhadores do MTD, a dimensão não é apenas social, mas também histórica. A experiência do Movimento vem no sentido de “desconstruir esta construção”, pois se pretende, com a organização dos trabalhadores desempregados, quebrar o isolamento e o individualismo – um dos principais obstáculos à construção de ação coletiva – e construir cooperações, outra forma de trabalhar, solidariedade, companheirismo, novas relações de produção e poder, partindo de quem vive a experiência do desemprego. Para isso, o MTD cumpre um papel de desconstrutor social desta “construção social do desemprego”. Junto com isso tudo, vem a desconstrução da lógica desta sociedade que deixa de fora boa parte da humanidade. O MTD é compreendido, por mim, como sendo uma ferramenta de transformação da realidade em que se encontram estes desempregados históricos. Portanto, a ferramenta que possibilita a construção real da experiência do trabalho humanizador.
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